sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

O papão

Ali estava ele. Hirto, menir ancestral. Do outro lado da rua, em pé, ao alto. Forte. Firme.
Olhou-o em frente, mas de lado. Tão grande, tão gordo, tão feio.
Um, dois beijos, na face. Na ferida.
Ali como previu. Aqui.
Aquele silêncio de sempre, tão grande, tão cheio. Só os pés no granito e os gritos do vento, frio, gelado. Grande. Cheio. Um pé e outro num andar em frente, sujavam a rua, marcavam-na para sempre. Como esta, tantas.
À chegada abrem-se as portas, as pernas. A alma. Mostra-se o cantinho, o conforto. As paredes limpas, imaculadas, virgens. E só de olhar tão sujas, violadas, penetradas.
Não pensa, nem existe. Não persiste, nem resiste.
Silêncio. Sufoco.
Vai-te embora! Sai daqui! Afinal não quer. Afinal não gosta.
Silêncio.
Uma mama. Duas mamas. Limpas. Imaculadas. Virgens. E sujas, violadas, penetradas sem palavra alguma, de olhos cerrados. Cego, distante. Marcante.
Esperma. Sangue. Lágrimas. Tantas lágrimas.
O grito dela, tão preso, já quase esquecido, condenado à morte, se libertava da garganta seca.
Minha neta.
Avó.
A presença da sua ausência, como antes por entre outras paredes sujas, confortava o grito inevitável.
Um dia. Dois meses. Três anos. A curar-se.
No colo dela.
Ó papão rola a menina.

6 comentários:

  1. Um emaranhado de palavras que, sentidas de perto, são capazes de povoar a alma, imensos que são os significados atribuíveis a um escrito que só tu poderás entender na plenitude.

    Gostei bastante.

    Um beijo

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  2. (Grata!)

    O comentário não poderia ser mais simples que isso. Não poderia ser outro senão este.
    Os imensos significados é que tornam as palavras mágicas.

    Afinal não serei só eu a entender na plenitude.

    Um beijo.

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  3. Gostava de poder decifrar a desordem que vai na tua mente. Talvez quando o vulcão acalmar…
    Cru e intenso. Gosto.
    *

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  4. O vulcão está calmo, acho até que não existe.

    Gosto de decifrar de onde vêm e para onde vão os vulcões. E nao preciso de ter um, basta-me imaginar. Está tudo dentro de nós.

    Grata.
    *

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  5. como te disse um dia, eles voltam a encontrar-se sempre, e logo os nossos, mas passados 4 anos, somos mto mais capazes de lhes tomar a redea....
    nao me esqueço nunca do tudo que partilhamos...
    beijo
    maximo

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  6. Máximo, sempre soubemos que assim seria.
    Passados tantos anos, somos tao diferentes e tao os mesmos.

    Também não me esqueço.

    Um beijo, Ghost.

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